Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) vão analisar dados de todas as usinas de etanol no Brasil para estimar o potencial que o setor sucroalcooleiro apresenta para a produção de hidrogênio (H2) no país e que poderá ser utilizado como combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês).
O trabalho será feito por cientistas do Grupo de Pesquisa em Bioenergia (GBio) do Instituto de Energia e Ambiente (IEE-USP) e do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído por FAPESP e Shell na Escola Politécnica (Poli-USP).
De acordo com dados de dezembro de 2022, o Brasil tem 358 usinas de etanol de cana-de-açúcar e 21 de etanol de milho. A partir da biomassa que sobra da produção é possível extrair o hidrogênio.
“O hidrogênio tem aparecido cada vez mais como vetor energético importante para a descarbonização de diferentes setores, incluindo o da aviação. O mais divulgado atualmente é o hidrogênio produzido a partir da eletrólise da água usando energia solar ou eólica, mas há também as rotas desenvolvidas a partir da biomassa, que são bastante competitivas”, afirma a engenharia química Suani Teixeira Coelho, professora do Programa de Pós-Graduação em Energia da USP e coordenadora do projeto, ao lado de Marcos Buckeridge, professor do Instituto de Biociências da USP e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) do Bioetanol.
“Vamos analisar as usinas que temos no Brasil – o quanto produzem de cana-de-açúcar, de etanol e o potencial que pode ser produzido de biogás a partir dos subprodutos do processo. A partir desses dados, vamos estimar a quantidade de hidrogênio que poderíamos produzir a partir de diferentes rotas: fazendo a reforma [quebrando as moléculas] do etanol e do biogás, além da eletrólise da água utilizando a eletricidade excedente local”, prossegue Suani.
De acordo com a pesquisadora, o estudo está na primeira etapa, que deve se prolongar por um ano. A expectativa é de que haja financiamento adicional, que poderá expandir a pesquisa para outras fontes de biomassa.
O estudo tem apoio do programa USPSusten e do INCT do Bioetanol, cujas pesquisas são financiadas prioritariamente pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Diferentes cenários para o etanol
O estudo trabalhará com diferentes cenários, abrangendo a demanda por etanol pelo transporte rodoviário e incluindo na análise o etanol de segunda geração (2G), considerado ainda mais sustentável que o de primeira geração por ser produzido a partir do bagaço de cana.
“Sempre que se usa um resíduo de biomassa, como o bagaço da cana, para gerar energia, se tem um sistema mais sustentável”, salienta Suani Coelho. “Primeiro, porque se dá um destino adequado a esse resíduo. E, segundo, porque não há necessidade de expansão da área de plantio. É um conceito que se enquadra no que chamamos de bioeconomia circular.”
Por enquanto, no país, há apenas uma usina de etanol 2G, situada no Bioparque Costa Pinto, em Piracicaba, no interior paulista, da empresa de energia Raízen. Outras duas usinas em São Paulo produzem biogás a partir de vinhaça e torta de filtro, resíduos da operação agroindustrial da cana-de-açúcar.
Para o estudo, os pesquisadores usarão um banco de dados montado durante outro projeto do RCGI, que analisou o potencial de captura de carbono nas usinas, e informações disponíveis na publicação NovaCana.
A tecnologia de transformar hidrogênio em combustível de aviação existe por enquanto apenas em nível de laboratório e os pesquisadores acompanham de perto os avanços, por considerar significativa a perspectiva do uso de hidrogênio direto ou como precursor de outros combustíveis sustentáveis de aviação.
Com informações da Agência FAPESP