Os combustíveis sustentáveis de aviação (SAF) são a principal aposta para descarbonizar o setor aéreo em todo o mundo. Para substituir o querosene (QAV), de origem fóssil, e atender à crescente demanda das companhias aéreas por combustível limpo será necessário investir em diversas matérias-primas e rotas tecnológicas. Pelo histórico e pela experiência com biocombustíveis, o Brasil desponta como um possível protagonista nesse mercado emergente e o Paraná, com suas vocações produtivas, também quer ser ator principal.
A aviação é um dos setores com grande dificuldade para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, notadamente o dióxido de carbono (CO2), exatamente pela dependência quase exclusiva do petróleo. Inverter esse cenário é um desafio urgente, vide o objetivo de zerar as emissões até 2050, tal como assumido por nações e pela indústria em palcos internacionais, como a Organização da Aviação Civil Internacional (Icao) e a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata). Hoje, menos de 1% de todo o combustível da aviação comercial consumido mundo é sustentável.
O Grupo de Ação de Transporte Aéreo (Atag), entidade que reúne vários atores dessa indústria, elenca quatro pilares fundamentais para o caminho rumo ao carbono zero: avanço da tecnologia de aviões e motores, melhoria na operação das aeronaves, compensação de carbono e adoção dos combustíveis alternativos. Este último pilar tem o potencial de representar até 70% de toda a redução na emissão de CO2 até a metade do século.
O SAF é um combustível produzido com qualquer fonte sustentável, como biomassas e resíduos de origem vegetal ou animal, e que apresentem características químicas semelhantes às do combustível fóssil. Eles são drop-in, ou seja, podem ser abastecidos diretamente nos aviões sem a necessidade de alterações nos motores ou nos sistemas das aeronaves. Por usarem fontes renováveis, a estimativa é de que o SAF, em média, emite 80% a menos de CO2 em seu ciclo de vida na comparação com combustíveis que usam o petróleo — o grau de redução depende dos processos e das matérias-primas.
Hoje existem oito rotas tecnológicas aprovadas internacionalmente pela American Society for Testing and Materials (ASTM), organização que certifica os processos para a produção de combustíveis. Cada uma com características específicas e processos que as transformam em SAF. A HEFA (ésteres hidroprocessados e ácidos graxos) é a mais popular no mundo e usa óleos vegetais e gorduras animais como fontes de energia. O produto final dessa rota precisa ser misturado em até 50% com combustível fóssil — alguns voos de testes estão sendo feitos para ampliar para 100%.
Uma outra rota é a FT-SPK (querosene parafínico hidroprocessado e sintetizado por Fischer-Tropsch), ainda não usada em larga escala, mas com potencial significativo, especialmente no Brasil. Isso porque ela usa culturas energéticas e resíduos sólidos urbanos, agrícolas e florestais como matérias-primas. E é nessa rota que o Paraná começa a vislumbrar a oportunidade de entrar no mercado de SAF.
O resíduo que vira biogás, que vira combustível
O biogás é um combustível produzido a partir da decomposição de materiais orgânicos de origem vegetal ou animal, vindos de três fontes principais: agropecuária, indústria e aterros sanitários/esgotos. Eles produzem uma mistura de gases, essencialmente de metano e dióxido de carbono (CO2), que podem ser transformados em energia térmica, energia elétrica, gás natural renovável ou combustíveis veiculares, como o biometano. Com o avanço da tecnologia e dos processos, o biogás também pode ser convertido em bio-syncrude, o petróleo sintético usado para produzir os combustíveis sustentáveis de aviação. No fim, o que seria um passivo ambiental acaba se tornando um ativo energético que colabora no enfrentamento à crise climática.
O Paraná é um dos atores mais relevantes no cenário do biogás no país. Segundo o Panorama do Biogás 2023, produzido pelo CIBiogás, uma Instituição de Ciência e Tecnologia com Inovação (ICTI+i) com sede em Foz do Iguaçu, o estado é o que tem mais plantas de biogás — são 404 no total, sendo que somente em 2023 foram abertas 142, representando um aumento de 54% em relação ao ano anterior. Nessas plantas, a capacidade instalada é de 461 milhões de Nm3 por ano, atrás somente de São Paulo (1,58 bilhão de Nm3) e Rio de Janeiro (565 milhões Nm3).
“O Paraná é o estado com maior número de plantas de biogás no Brasil. Por ser precursor da produção de SAF, essa alta concentração torna o biogás uma matéria prima interessante”, aponta a gerente de Engenharia e de Operações do CIBiogás, Daiana Gotardo.
Apesar de já contar com uma cadeia produtiva bem estruturada, o Paraná apresenta um potencial ainda maior no biogás: 1,7 bilhão de Nm3 por ano, puxado principalmente pela indústria e suas unidades sucroenergéticas, abatedouros e frigoríficos, cervejarias e laticínios, além da pecuária e do saneamento. Esse volume de biogás seria capaz de produzir, de acordo com o CIBiogás, 104,7 milhões de litros de SAF, o equivalente a 45% de todo o querosene de aviação que saiu da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba, para abastecer aeronaves — os dados do refino são do Painel Dinâmico do Mercado Brasileiro de Combustíveis de Aviação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Uma política para o biogás e o biometano, como o Combustível do Futuro, dá segurança maior de investimentos e possibilidade de plantas maiores.”
Talyta Viana Cabral, coordenadora técnica-regulatória da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás).
O uso do biogás para a produção de combustível veicular é uma realidade há alguns anos. O olhar para ele como fonte de combustíveis avançados, porém, é algo mais recente. “A produção de SAF é mais uma rota tecnológica que valoriza o que o país tem hoje em termos de resíduos, um passivo ambiental. É muito interessante pensar uma destinação e transformar em um ativo, como biocombustíveis”, comenta a coordenadora técnica-regulatória da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás), Talyta Viana Cabral.
A produção de SAF no Brasil é inexistente, seja a partir do biogás ou em qualquer outra rota tecnológica. Há vários projetos e anúncios para a instalação de biorrefinarias, mas nenhuma saiu do papel. Do ponto de vista do investidor, ainda falta segurança jurídica para garantir que haverá demanda pelo produto. Ou seja, não há a certeza do retorno financeiro. As apostas para destravar esse cenário estão no Projeto de Lei 4.516/2023, batizado de Combustível do Futuro, que institui o Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV) e cria mecanismos para fomentar a produção e o uso de SAF. O biometano também foi contemplado no projeto.
O PL do Combustível do Futuro foi aprovado em março deste ano na Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado Federal. Pelo texto que passou na Câmara, as companhias aéreas brasileiras serão obrigadas a reduzir as emissões nas rotas domésticas, começando com 1% em 2027 e subindo de forma escalonada até 10% em 2037. Para atender esse mandato, o principal caminho será o SAF, o que deve gerar uma procura pelo produto e, consequentemente, demandar a produção local desse combustível.
No Senado, o texto ainda pode passar por mudanças. A mais temida, segundo o setor do biogás, é que esta matriz energética seja retirada. “Nossa avaliação é bastante positiva e estamos trabalhando incansavelmente esse tema”, diz Talyta. “Uma política para o biogás e o biometano, como o Combustível do Futuro, dá segurança maior de investimentos e possibilidade de plantas maiores”, acrescenta.
Primeira planta piloto de SAF a partir do biogás está no Paraná
A tecnologia não pode esperar e evolui mais rapidamente que os debates políticos. Foi dessa forma, antes de qualquer definição sobre o PL do Combustível do Futuro, que nasceu a primeira planta piloto de produção de bio-syncrude, um óleo cru sintético com características semelhantes ao petróleo bruto, e que serve como base para a produção do SAF. E ela usa o biogás e está no Paraná, em um lugar estratégico: a usina Itaipu Binacional, em Foz do Iguaçu.
A Unidade de Produção de Hidrocarbonetos Renovável do CIBiogás foi inaugurada em 17 de junho e está em fase de testes para validar as condições operacionais. A expectativa é produzir 6 kg de bio-syncrude por dia, material que será enviado para o Laboratório de Cinética e Termodinâmica Aplicada (LACTA) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) para caracterização e refino para obtenção das frações do SAF.
Trata-se de um trabalho feito a várias mãos, a começar pelo governo alemão que investiu R$ 9 milhões na planta por meio do Ministério Federal da Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha (BMZ), dentro do projeto H2Brasil, implementado pela Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ). A unidade é fruto da parceria entre a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, UFPR, Fundação Araucária, Parque Tecnológico de Itaipu (hoje Itaipu Parquetec) e Itaipu Binacional.
Entendemos que [o SAF] é uma quarta rota de utilização do biogás e o Paraná tem muita chance para que isso aconteça.”
Rafael Hernando de Aguiar González, diretor-presidente do CIBiogás.
A planta usa resíduos dos restaurantes do complexo de Itaipu e materiais orgânicos apreendidos na região da fronteira pela Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal, Receita Federal e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Após a biodigestão dos resíduos, são removidas as impurezas do biogás para entrar na planta de fato.
O processo começa com a entrada do biogás no reator de reforma a seco para a produção do gás de síntese (syngas), que é uma mistura de hidrogênio (H2) e monóxido de carbono (CO). Em seguida, o gás entra no reator de Fischer-Tropsch (FT) junto com o hidrogênio verde, que é responsável pela hidrogenação do monóxido de carbono para formar os hidrocarbonetos, notadamente os parafínicos na faixa de cadeia carbônica de C8 a C16, intervalo no qual fica o combustível de aviação.
O hidrogênio verde é importante não somente para o processo em si, mas também pela pegada mais baixa de carbono, fundamental para reduzir as emissões em todo o ciclo de vida de produção do SAF. Esse hidrogênio é produzido pelo Parquetec, que usa o processo de eletrólise a partir de energia renovável, e transportado em cilindros até a planta, a cerca de dois quilômetros de distância.
O desafio de construir e fazer funcionar a planta piloto foi vencido. Agora o objetivo é levar a tecnologia a outro patamar de volume. “O que vem a partir de agora é um trabalho de escalar a tecnologia. Estamos falando de encontrar um local específico, a demanda adequada e os atores certos para fazer acontecer a planta de outro tamanho”, explica o diretor-presidente do CIBiogás, Rafael Hernando de Aguiar González.
Ele acredita que isso é uma questão de tempo e que, em algum momento, vai acontecer. O próprio CIBiogás tem conversas com potenciais investidores para transportar a planta piloto para uma escala industrial. Mesmo que a tecnologia possa ser replicada em qualquer lugar do Brasil, é determinante que as unidades de produção de SAF estejam próximas da origem do material orgânico a ser transformado em biogás.
Por essa razão, o Paraná não só se posiciona como importante ator no biogás, mas também nos combustíveis avançados. “Já inauguramos planta de geração de energia elétrica, já inauguramos planta para caldeira, já fizemos funcionar frota de veículos a biometano, então entendemos que essa é uma quarta rota de utilização do biogás e o Paraná tem muita chance para que isso aconteça”, completa González.
Com o biogás do setor sucroalcooleiro também se faz SAF
A 420 quilômetros da usina de Itaipu está Tamboara, uma pequena cidade no Noroeste do Paraná, com cerca de 5 mil habitantes. É lá onde está instalada, desde 2012, a Geo Elétrica Tamboara, uma planta de produção comercial de biogás que opera a partir de resíduos da cana-de-açúcar e outros resíduos agrícolas para gerar energia elétrica e biometano. Ela é o ponto de partida para projetos de SAF.
Em 2022, a Geo bio gas&carbon foi selecionada pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) em um edital para a pesquisa e desenvolvimento de tecnologias para a otimização de produção de SAF a partir do biogás. Os R$ 7,5 milhões de subvenções foram partilhados com a Universidade Estadual de Maringá (UEM) para o uso de um catalisador para a produção do gás de síntese (syngas) e entrada desse material na reação de Fischer-Tropsch.
O plano da Geo bio gas&carbon é construir uma planta de demonstração comercial e colocá-la em operação em 2025 para produzir 550 litros de SAF por dia. A implantação da unidade empregará a rota GTL (Gas-To-Liquid), também usando o processo de Fischer-Tropsch para a obtenção do bio-syncrude. No caso da unidade da Geo, a ideia é também produzir outros hidrocarbonetos, como a gasolina sintética. Tudo com base no que foi pesquisado e desenvolvido no Paraná a partir do edital da Finep.
Como um dos maiores produtores de cana do país, o Paraná tem sim condições de assumir uma posição de protagonismo neste mercado.”
Alysson Oliveira, gerente de Novas Tecnologias e Combustíveis Avançados da Geo bio gas&carbon.
“A adoção dessa rota nos garantirá escala e competitividade para atendimento do mercado de aviação uma vez que a base da produção está no aproveitamento dos resíduos orgânicos da agroindústria, que costumo chamar do nosso ‘pré-sal caipira’”, destaca o gerente de Novas Tecnologias e Combustíveis Avançados da Geo bio gas&carbon, Alysson Oliveira.
O “pré-sal caipira” do Noroeste do Paraná se baseia, pelo menos no caso da Geo, na cana-de-açúcar. A região é a principal produtora da cultura no estado. Hoje, por exemplo, a Geo Elétrica Tamboara recebe resíduos da cana para processar torta de filtro, vinhaça e palha, e então transformar em biogás. “Como um dos maiores produtores de cana do país, o Paraná tem sim condições de assumir uma posição de protagonismo neste mercado. Hoje, já somos relevantes. Temos matéria-prima, temos tecnologia, um parque de usinas e mão de obra qualificada”, reforça Oliveira.
O projeto da planta de SAF da Geo bio gas&carbon ganhou recentemente o reforço da Copersucar, uma das maiores produtoras de álcool e açúcar do mundo. Um acordo entre as empresas foi assinado em junho deste ano e prevê a construção de uma planta em escala industrial com capacidade para 50 milhões de litros de combustível sustentável de aviação por ano — 250 vezes a mais que a unidade de demonstração.“Esse é o primeiro projeto no Brasil para produção de SAF em escala semi-industrial, o que significa que a planta já nasce com as bases prontas para elevar de maneira rápida a produção ao nível de escala industrial”, completa Oliveira.
Óleo de soja e etanol também são caminhos para o SAF no Paraná
Não é só a partir do biogás que o Paraná pode despontar na produção de combustível sustentável de aviação. Duas outras rotas tecnológicas entraram no radar do Grupo Potencial, que tem a maior usina de biodiesel do Brasil, localizada na Lapa, e é um dos principais atores na transição energética do setor de transporte no país. Uma é a HEFA, que usa o óleo de soja e outros óleos para a conversão em SAF, e a outra é a Alcohol-to-Jet (ATJ), que tem o etanol como base para a produção do combustível sustentável para os aviões.
Os planos da companhia ainda são iniciais, tanto que ainda não há uma clareza sobre qual é o melhor caminho para entrar nesse mercado. O certo é que o Grupo Potencial está se preparando para embarcar no SAF. Para isso, vem investindo fortemente na consolidação da produção de biodiesel e etanol no estado — hoje a capacidade de produção da empresa é de 900 milhões de litros de biodiesel por ano. Essa expertise será fundamental para a aposta no SAF.
“A produção de SAF vai ser escalonada de acordo com a oferta e a demanda que teremos tanto no mercado interno como externo e, claro, sempre olhando para segurança para poder dedicar recursos em um investimento como esse”, revela o vice-presidente Comercial, Operacional e de Relações Institucionais do Grupo Potencial, Carlos Eduardo Hammerschmidt.
Estamos cada dia mais nos alinhando ao nosso propósito de sermos protagonistas na transição energética sustentável.”
Carlos Eduardo Hammerschmidt, vice-presidente Comercial, Operacional e de Relações Institucionais do Grupo Potencial.
No ano passado, a empresa anunciou o investimento de R$ 1,7 bilhão na construção de uma fábrica de processamento de soja e produção de óleo e farelo na Lapa. Mais recentemente, divulgou o plano de construir dois dutos de biocombustíveis entre a usina de biodiesel e distribuidores em Araucária — esse investimento será de R$ 200 milhões. Com essa infraestrutura pronta, a expectativa é poder olhar com mais força para novos produtos, incluindo o SAF.
A Lapa é o centro nevrálgico de todo o ecossistema de transição energética do Grupo Potencial. “O complexo industrial da Lapa tem como objetivo ofertar ao mercado o maior portfólio possível de energias sustentáveis aos seus clientes. Estamos cada dia mais nos alinhando ao nosso propósito de sermos protagonistas na transição energética sustentável”, prossegue Hammerschmidt.
Os investimentos diretos para o SAF ainda dependem de um cenário jurídico mais claro. E a resposta também passa pela aprovação do PL do Combustível do Futuro no Senado Federal. Segundo o grupo, a construção de uma planta de SAF pode custar entre US$ 300 milhões e US$ 1 bilhão, dependendo da tecnologia e da escala de produção. Um custo considerado muito alto enquanto não há certeza de que as companhias aéreas brasileiras realmente buscarão o produto nos próximos anos.
“O PL do Combustível do Futuro dá a segurança jurídica para os investimentos futuros. Com ele teremos geração de emprego e renda, e principalmente o Brasil pode se posicionar como um um dos maiores produtores de energia verde mundial”, vislumbra o vice-presidente do Grupo Potencial.
Dejetos humanos podem ser matéria-prima para o SAF
Praticamente qualquer material orgânico pode ser transformado em combustível, inclusive dejetos humanos que vão parar nos sistemas de esgotos das cidades. É até difícil imaginar que fezes das pessoas podem ser matéria-prima para um produto avançado como o SAF, mas é nisso que a empresa britânica FireFly Green Fuels tem dedicado esforços e recursos, buscando parceiros em vários cantos do mundo para tentar escalar a tecnologia. No Brasil, a Sanepar, a Companhia de Saneamento do Paraná, está estudando essa possibilidade.
O lodo de esgoto é um resíduo sólido formado por uma mistura de matéria orgânica, partículas de resíduos alimentares, microrganismos, restos químicos e outros. Ele é gerado durante o tratamento biológico de esgotos sanitários. Esse produto, quando higienizado, se transforma em fertilizante orgânico usado na agricultura para melhorar propriedades do solo e elevar a produtividade agrícola.
O que a FireFly está fazendo é dar uma destinação ainda mais nobre para esse material. Para isso, a empresa desenvolveu um processo de liquefação hidrotérmica (HTL) que usa uma combinação de alta pressão e calor em níveis de energia mais baixos e converte os resíduos em bio-syncrude, o óleo sintético com propriedades similares às do petróleo e base para o refino do SAF. De acordo com a companhia britânica, o combustível sustentável de aviação produzido a partir desse processo emite 92% a menos de gases do efeito estufa em seu ciclo de vida na comparação com o querosene de origem de fóssil.
Para escalar essa tecnologia, a FireFly está fechando parcerias com diversas empresas do setor aéreo, como a Boeing, que vai investir nessa tecnologia para acelerar a adoção de SAF na aviação comercial. Os recursos estão sendo direcionados para a construção de uma planta piloto em Harwich, na Inglaterra, e posteriormente para a instalação de uma unidade de escala comercial.
Em abril deste ano, o diretor-presidente da Sanepar, Claudio Stabile, e o especialista em Pesquisa e Inovação da Sanepar, Gustavo Rafael Collere Possetti, estiveram na Inglaterra para conhecer de perto essa tecnologia e identificar maneiras de replicar o processo nas estações de tratamento da companhia no Paraná. E voltaram de lá com um acordo assinado para estudar a possibilidade de converter o lodo de esgoto em SAF.
Devido à confidencialidade do termo assinado pela Sanepar com a FireFly e a Green Fuels Research — empresa britânica focada em biocombustíveis —, a companhia paranaense não pode fornecer mais detalhes sobre as pesquisas e os planos para o uso do lodo de esgoto na produção de combustível. Em nota, a Sanepar comentou que a “tecnologia britânica é disruptiva em nível mundial” e que abre uma nova possibilidade de “aproveitamento dos recursos gerados nos processos operacionais.”