Voo Limpo Combustíveis Macaúba se posiciona como matéria-prima promissora para SAF no Brasil

Macaúba se posiciona como matéria-prima promissora para SAF no Brasil

Palmeira nativa tem capacidade de produzir mais óleo do que a soja e a palma de óleo e desperta a atenção de investidores de combustível sustentável de aviação

Macaúba fornece até 5 toneladas de óleo por hectare. Foto: Shutterstock

A produção de combustível sustentável de aviação (SAF) depende exclusivamente da disponibilidade de matérias-primas. No Brasil há muitas e para diferentes rotas tecnológicas, como cana-de-açúcar, soja, milho, canola, palma de óleo, sebo bovino, biogás, entre outras. Ainda um pouco esquecida, mas com um potencial de mercado promissor, está a macaúba, uma palmeira nativa que promete ser uma das principais frentes para que o país se torne protagonista na produção de SAF.

Para produzir combustível pela rota HEFA (ácidos graxos e ésteres hidroprocessados), a mais usada atualmente e com tecnologia comprovada e em uso em várias partes do mundo, é necessária uma fonte que produza muito óleo. A macaúba é capaz de fornecer até 5 toneladas de óleo por hectare, bem acima dos 800 quilos que a soja proporciona e mesmo dos 3.500 quilos gerados pela palma de óleo. 

Além da capacidade de gerar óleo, a macaúba tem uma vantagem competitiva em relação a outras matérias-primas: ela é encontrada em quase todo o território nacional. Isso expande as possibilidades comerciais e de investimentos para mais partes do país, o que pode ser particularmente interessante dentro de uma futura cadeia logística do SAF.

Palmeira da macaúba
Macaúba pode ser plantada junto com outras culturas e pasto. Foto: Shutterstock

“A macaúba tem maior possibilidade de terra, inclusive em áreas de pastagens com algum estágio de degradação. Isso é importante, para recuperar áreas que já foram modificadas da paisagem natural. Não há mudança do uso do solo”, aponta a pesquisadora da Embrapa Agroenergia, Simone Favaro, que coordena o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) da macaúba, estudo que disponibiliza dados sobre as regiões mais favoráveis para o plantio dessa cultura.

A macaúba tem muita variabilidade genética, então é preciso selecionar os indivíduos que produzem mais, assim as chances de os filhos produzirem mais é muito maior.”

Simone Favaro, pesquisadora da Embrapa Agroenergia.

A macaúba pode ser plantada em sistemas mistos, junto com outras culturas e também onde há produção animal. Isso significa que não há a necessidade de abrir novas áreas para que ela seja plantada, o que é determinante para que a matéria-prima seja certificada dentro dos mais rigorosos padrões internacionais, que levam em conta os processos em todo o ciclo de vida de produção do combustível. É, por exemplo, uma dificuldade encontrada pela palma de óleo, restrita a regiões de floresta tropical úmida, como a Amazônia.

“O que não queremos é repetir isso com a macaúba no Brasil. Não queremos que siga no mesmo caminho [da palma de óleo]. Por isso que estamos incentivando o cultivo da macaúba em sistemas mistos, integrados, não só com a macaúba, mas com lavouras e produção animal. E de preferência usando terras que foram desmatadas para não expandir a fronteira agrícola. Essa abordagem é que vai fazer toda a diferença para a cadeia da macaúba”, destaca Simone.

O fruto da macaúba: diversos potenciais de uso

A macaúba é uma palmeira que pode atingir 20 metros de altura, com troncos de 20 a 30 centímetros. Como é encontrada em várias partes do Brasil, é conhecida por nomes diferentes em algumas regiões. No Nordeste, por exemplo, fala-se em macaíba. No Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, ela é chamada de bocaiúva. Em Goiás é conhecida por coco-babão. A área nativa da macaúba no Brasil se estende do Oeste do Rio Grande do Sul a áreas da Amazônia e do semiárido.

Os frutos da macaúba são arredondados com tamanho que varia entre 2 e 3,5 centímetros. Eles são compostos por casca, polpa, caroço ou endocarpo e a amêndoa. A quantidade de frutos por palmeira varia bastante, podendo chegar a até 200 quilos.

Fruto da macaúba pode chegar a 3,5 centímetros de diâmetro. Foto: Shutterstock

No Brasil há registros de oito espécies de macaúba, mas o interesse econômico se concentra em três delas: Acrocomia aculeata (de ocorrência predominante no Brasil Central), Acrocomia totai (Noroeste do Paraná, Oeste de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Pantanal) e Acrocomia intumescens (algumas áreas do Nordeste).

Para a produção de óleo, a Aculeata se destaca sobre as demais. Entretanto, o fruto da macaúba pode ser utilizado na totalidade, para diversos fins. A casca, por exemplo, pode ser usada para produzir energia e o endocarpo, por ter alto poder calorífico, pode ser destinado para produzir carvão ativado.

A polpa do fruto da macaúba é a principal fonte para a produção de óleo, mas a amêndoa também pode ser usada. Em geral, 80% do óleo sai da polpa e 20% da amêndoa. A macaúba fornece 25 toneladas de fruto por hectare, sendo quatro de óleo e 21 toneladas de outros materiais, que podem ser usados pela indústria.

O fruto da macaúba

Fonte: Embrapa. Foto: Shutterstock.

Produtividade da macaúba é desafio para investidor

O potencial da macaúba para a produção de combustível sustentável de aviação (SAF) e diesel verde já despertou o interesse de grupos econômicos. Só que, ao mesmo tempo que se apresenta como uma matéria-prima promissora, ela coloca alguns desafios para quem pretende cultivá-la em larga escala.

Em primeiro lugar há o tempo para o cultivo. A macaúba é uma planta perene, mas a primeira colheita pode demorar de cinco a seis anos, com a produção se estabilizando em oito a nove anos. Por essa razão, qualquer investimento deve ser pensado a longo prazo e, de preferência, em um ambiente integrado.

“É um período longo, é demorado. Por isso, temos trabalhado para que ela entre no sistema de integração, porque não dá para esperar para ter retorno. Seja com soja, mandioca, o que for da vocação da região, isso vai amortizar o investimento”, aponta a pesquisadora da Embrapa Agroenergia.

Estamos incentivando o uso de terras que foram desmatadas para não expandir a fronteira agrícola. Essa abordagem é que vai fazer toda a diferença para a cadeia da macaúba.”

Simone Favaro, pesquisadora da Embrapa Agroenergia.

Outra dificuldade da macaúba é encontrar material altamente produtivo, já que parte da plantação pode não entregar a quantidade esperada de fruto e, consequentemente, de óleo para a produção de SAF. “A macaúba tem muita variabilidade genética, então é preciso selecionar os indivíduos que produzem mais, assim as chances de os filhos produzirem mais é muito maior. Isso é importante para não se correr o risco de ter o investimento frustrado”, complementa Simone.

A Acelen Renováveis, braço de biocombustíveis da Acelen e que tem como principal investidor o grupo Mubadala Capital, anunciou o investimento de US$ 2,5 bilhões na construção de uma biorrefinaria anexa à refinaria de Mataripe, em São Francisco do Conde, na Bahia, e na implantação de cinco hubs para o cultivo da macaúba em um área de 200 mil hectares na Bahia e em Minas Gerais.

Em maio deste ano, inclusive, representantes da Acelen Renováveis buscaram a Embrapa Cerrados para conhecer mais sobre as pesquisas a respeito da macaúba. A instituição implantou experimentos em Planaltina (DF) em 2006 com plantas originadas de Minas Gerais e São Paulo. Segundo o pesquisador Marcelo Fidelis, algumas plantas produzem cachos de 6 quilos e outras de até 25 quilos. Além disso, das 1.200 palmeiras plantadas, 200 não sobreviveram.

A palmeira da macaúba pode produzir cachos de até 25 quilos. Foto: Shutterstock

Além das pesquisas genéticas, a publicação do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) da macaúba, validado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), ajuda o investidor a tomar as melhores decisões, especialmente em relação às regiões mais propícias para o cultivo da planta.

“O principal objetivo de colocar a macaúba no pipeline do Zarc é o referendo de que é uma espécie pensada de forma séria e estratégica, com conhecimento e tecnologia”, diz Simone Favaro, coordenadora do Zarc da macaúba. “Isso dá segurança porque mostramos o risco menor para o cultivo. Para o empreendedor, quando ele olha para o Zarc, vê um guia, sabe onde é mais favorável. É uma ferramenta importante para um tomador de decisão”, completa.

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